Hoje
passei por uma experiência de muito envolvimento emocional. Não planejei nada
do que aconteceu, apenas deixei que acontecesse. Não contive nenhuma das minhas
emoções nem nenhuma das minhas vontades, algo que vai até um pouco contra a
minha personalidade.
Tudo começou quando abri o portão da
velha casa da minha, infelizmente, falecida avó. Um lugar, onde,
inevitavelmente, cada passo traz a tona alguma lembrança da minha infância,
vivida em grande parte naquele pátio e naquela casa. Ao ver os cães mais novos,
imediatamente me lembro dos antigos, como o velho Bob, um pequeno vira-lata
preto de olhos verdes que sempre esteve com a família, até falecer, aos 18 anos
de idade.
A porta da frente ainda precisava de
um empurrãozinho mais forte pra abrir. O banheiro estava impecavelmente limpo,
como a velha senhora sempre o deixava. O quarto dela, cuidado e mantido pelo
meu avô até hoje, permanecia exatamente igual ao que sempre fora, como se ela
ainda estivesse ali, deitada na cama, assistindo novela. A foto na mesinha de
cabeceira me encheu de saudades.
Na sala, as fotos dos filhos, meus
tios e minha mãe, organizados em murais ou em pequenos porta-retratos na
estante, onde também estavam expostos os troféus de torneios de canastra da
minha avó e as medalhas dos campeonatos de futebol do meu tio mais novo. Senti
falta da televisão grande, época em que era preciso girar os botões pra captar
canais e torcer pra achar algum.
Porém
as primeiras lágrimas só encheram meus olhos no momento que achei outra
fotografia, da minha avó sorrindo de maneira linda, durante sua coroação como
Rainha do Grupo de Idosos. As gotas caíram pesadamente no chão, aquecendo meu
rosto e deixando meus olhos vermelhos. Eu não fiz nada pra parar.
As lembranças da velhinha apareciam
cada vez mais claras. O jeito que fazia pão, a maneira como trabalhava horas
organizando e preparando as festas de aniversário dos netos, as conversas e conselhos, as
lições e até mesmo as pouquíssimas brigas.
- É muito injusto pensar que estou
tão feliz e não poder dividir isso com a senhora... – eu me ouvi dizendo, para
a foto. – Passar no vestibular, conseguir emprego, me apaixonar... Tanta coisa
pra contar... Tanta coisa pra agradecer. Todas as lições, toda a influência que
resultou no que sou hoje.
Mais lágrimas. Mais lembranças. Suco
de goiaba. Bolo de chocolate. Dia das Mães. Todos os primos, todos os tios
juntos ao redor da mesa. Isso nunca mais aconteceu.
- O que eu não faria pra não passar
só mais um dia na companhia da senhora...
Algum
tempo depois, mais calmo, fui até o quintal dos fundos, um lugar cheio de
árvores, com o velho depósito do meu avô ao fundo, lugar que me dava muito medo
antigamente. Aqui havia uma laranjeira. Ali, uma bananeira. Não pela primeira
vez, senti o meu mundo se encolher sobre mim.
E, quando criança, aquele era o meu
mundo. E ele era enorme. Uma floresta enorme e selvagem, cheia de árvores e
animais perigosos. Tempos em que eu vestia um casaco azul e um par de botas e
corria pelo pátio gritando: “Sou um Power Ranger!”
Hoje tudo me pareceu tão
pequeno. O velho pé-de-araçá, árvore que
era antes um desafio subir, agora é tão baixa que eu poderia subi-la como se
fosse uma escada. A pedra onde eu costumava sentar quando cansava é só um pouco
maior que uma bola de futebol.
Porém,
foi ao ver a goiabeira, alta, imponente e linda, como sempre fora, que eu
percebi o quanto aquelas lembranças eram fortes, o quanto a minha infância
tinha sido boa. E, ao mesmo tempo em que eu ficava triste por esse tempo já ter
passado, me sentia feliz, porque tinha vivido ele da maneira mais divertida,
mais intensa e mais alegre que fosse possível.
E para terminar de me purificar, eu
e São Pedro me permitiram, algum tempo depois, já no pátio da minha atual
residência, tomar um longo e maravilhoso banho de chuva, onde corri, pulei e
esqueci totalmente quantos anos eu tenho. Às vezes somos forçados pelos outros
e por nós mesmos a sermos adultos cada vez mais cedo, que logo nos esquecemos
de ser também um pouquinho criança.
E foi então que eu fui acometido por
uma incontrolável vontade de rir, como se os pingos de chuvas que caíam sobre
minha face e meu corpo fizessem cócegas nele. Nesse momento, não pela
primeira vez, apesar de não ter religião, senti uma certeza absoluta de que
Deus existe.
Mas foi só quando vi os pequenos
pedaços da noite se revelando por trás das nuvens de chuva que eu entendi o
quanto aquele momento era importante pra mim. Só naquele momento eu vi o que
essa experiência visava me ensinar. Ela veio pra me ensinar que não importa o
tempo que passe, não importa onde nós estamos sempre levamos com a gente um
pedacinho de cada pessoa ou situação, na forma de tudo aquilo que aprendemos
com ela.
Afinal, mesmo eu sendo mais alto, mais forte
ou mais inteligente do que antes, no fundo eu ainda sou aquele garotinho,
correndo pelo meu mundinho, tentando ser algum tipo de super-herói.
Créditos dessa última foto pro meu amigo André Sant'Anna... Primeiro post do blog, espero que curtam! XD
Este comentário foi removido pelo autor.
ResponderExcluirEste comentário foi removido pelo autor.
ResponderExcluir