domingo, 19 de fevereiro de 2012

O Meu Mundinho



             Hoje passei por uma experiência de muito envolvimento emocional. Não planejei nada do que aconteceu, apenas deixei que acontecesse. Não contive nenhuma das minhas emoções nem nenhuma das minhas vontades, algo que vai até um pouco contra a minha personalidade.
            Tudo começou quando abri o portão da velha casa da minha, infelizmente, falecida avó. Um lugar, onde, inevitavelmente, cada passo traz a tona alguma lembrança da minha infância, vivida em grande parte naquele pátio e naquela casa. Ao ver os cães mais novos, imediatamente me lembro dos antigos, como o velho Bob, um pequeno vira-lata preto de olhos verdes que sempre esteve com a família, até falecer, aos 18 anos de idade.
            A porta da frente ainda precisava de um empurrãozinho mais forte pra abrir. O banheiro estava impecavelmente limpo, como a velha senhora sempre o deixava. O quarto dela, cuidado e mantido pelo meu avô até hoje, permanecia exatamente igual ao que sempre fora, como se ela ainda estivesse ali, deitada na cama, assistindo novela. A foto na mesinha de cabeceira me encheu de saudades.
            Na sala, as fotos dos filhos, meus tios e minha mãe, organizados em murais ou em pequenos porta-retratos na estante, onde também estavam expostos os troféus de torneios de canastra da minha avó e as medalhas dos campeonatos de futebol do meu tio mais novo. Senti falta da televisão grande, época em que era preciso girar os botões pra captar canais e torcer pra achar algum.
          Porém as primeiras lágrimas só encheram meus olhos no momento que achei outra fotografia, da minha avó sorrindo de maneira linda, durante sua coroação como Rainha do Grupo de Idosos. As gotas caíram pesadamente no chão, aquecendo meu rosto e deixando meus olhos vermelhos. Eu não fiz nada pra parar.
            As lembranças da velhinha apareciam cada vez mais claras. O jeito que fazia pão, a maneira como trabalhava horas organizando e preparando as festas de aniversário dos netos, as conversas e conselhos, as lições e até mesmo as pouquíssimas brigas.
            - É muito injusto pensar que estou tão feliz e não poder dividir isso com a senhora... – eu me ouvi dizendo, para a foto. – Passar no vestibular, conseguir emprego, me apaixonar... Tanta coisa pra contar... Tanta coisa pra agradecer. Todas as lições, toda a influência que resultou no que sou hoje.
            Mais lágrimas. Mais lembranças. Suco de goiaba. Bolo de chocolate. Dia das Mães. Todos os primos, todos os tios juntos ao redor da mesa. Isso nunca mais aconteceu.
            - O que eu não faria pra não passar só mais um dia na companhia da senhora...
         Algum tempo depois, mais calmo, fui até o quintal dos fundos, um lugar cheio de árvores, com o velho depósito do meu avô ao fundo, lugar que me dava muito medo antigamente. Aqui havia uma laranjeira. Ali, uma bananeira. Não pela primeira vez, senti o meu mundo se encolher sobre mim.
            E, quando criança, aquele era o meu mundo. E ele era enorme. Uma floresta enorme e selvagem, cheia de árvores e animais perigosos. Tempos em que eu vestia um casaco azul e um par de botas e corria pelo pátio gritando: “Sou um Power Ranger!”
            Hoje tudo me pareceu tão pequeno.  O velho pé-de-araçá, árvore que era antes um desafio subir, agora é tão baixa que eu poderia subi-la como se fosse uma escada. A pedra onde eu costumava sentar quando cansava é só um pouco maior que uma bola de futebol.

               Porém, foi ao ver a goiabeira, alta, imponente e linda, como sempre fora, que eu percebi o quanto aquelas lembranças eram fortes, o quanto a minha infância tinha sido boa. E, ao mesmo tempo em que eu ficava triste por esse tempo já ter passado, me sentia feliz, porque tinha vivido ele da maneira mais divertida, mais intensa e mais alegre que fosse possível.
            E para terminar de me purificar, eu e São Pedro me permitiram, algum tempo depois, já no pátio da minha atual residência, tomar um longo e maravilhoso banho de chuva, onde corri, pulei e esqueci totalmente quantos anos eu tenho. Às vezes somos forçados pelos outros e por nós mesmos a sermos adultos cada vez mais cedo, que logo nos esquecemos de ser também um pouquinho criança.
            E foi então que eu fui acometido por uma incontrolável vontade de rir, como se os pingos de chuvas que caíam sobre minha face e meu corpo fizessem cócegas nele. Nesse momento, não pela primeira vez, apesar de não ter religião, senti uma certeza absoluta de que Deus existe.
            Mas foi só quando vi os pequenos pedaços da noite se revelando por trás das nuvens de chuva que eu entendi o quanto aquele momento era importante pra mim. Só naquele momento eu vi o que essa experiência visava me ensinar. Ela veio pra me ensinar que não importa o tempo que passe, não importa onde nós estamos sempre levamos com a gente um pedacinho de cada pessoa ou situação, na forma de tudo aquilo que aprendemos com ela.
 Afinal, mesmo eu sendo mais alto, mais forte ou mais inteligente do que antes, no fundo eu ainda sou aquele garotinho, correndo pelo meu mundinho, tentando ser algum tipo de super-herói.


Créditos dessa última foto pro meu amigo André Sant'Anna... Primeiro post do blog, espero que curtam! XD

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